LISTA A

SUSANA FIGUEIREDO

PROCURADORES DA REPÚBLICA - 1.ª efetiva


Carla Susana Teixeira Figueiredo

  • Procuradora da República, colocada na Comarca de Lisboa, Departamento de Investigação e Ação Penal do Barreiro, em comissão de serviço no Departamento Central de Investigação e Ação Penal
SUSANA FIGUEIREDO
SUSANA FIGUEIREDO

Ao preparar este texto acerca da motivação que presidiu à decisão de integrar a lista "A" candidata às eleições para o CSMP, revisitei o "Em Nome do Povo", de Cunha Rodrigues, e de lá respiguei o relato da memória da íntima relação entre o restabelecimento da democracia e a refundação do Ministério Público, assim como a ideia de que, com o nascimento de uma nova magistratura, em 1978, nasceu igualmente uma "questão geracional", na qual assumiu um papel determinante o SMMP, e as «gerações de jovens, provindas das lutas estudantis, temperadas pela contestação ao antigo regime e, com a revolução do 25 de Abril, seduzidas pelo vanguardismo ideológico e deslumbradas pela oportunidade de mudar o mundo». Relembra o nosso ex-PGR, nesse mesmo local, um período de lutas intestinas e de «activismo sindical intenso, muitas vezes na fronteira da intervenção política, mais predisposto à ruptura que à evolução, algumas vezes incapaz de surpreender a diferença entre estatuto da função e defesa de interesses profissionais».

Tendo eu entrado para a magistratura em 1997, um ano antes do Estatuto de 1998, 19 anos depois da Lei Orgânica de 1978, não vivenciei tais tempos aguerridos, mas tive a felicidade de ser legatária de muitos testemunhos de quem os viveu, conviver com colegas junto a quem fui ouvindo e aprendendo dessa história do Ministério Público, feita de grandes lutas mas também de pequenas querelas, mas, acima de tudo, de partilhar experiências e memórias com colegas portadores de um comum orgulho pela magistratura que integravam e pela qual, no respectivo desempenho funcional, lutavam por dignificar, assumindo, sem servilismos funcionais e institucionais, a sua identidade própria. É, pois, em nome desta memória e legado comum que aceitei este desafio.

Desafio que julgo tão mais relevante quanto o crescente adensar de receios colectivos da iminência de uma funcionalização dos Magistrados pela deterioração do seu estatuto. Receio não do funcionalismo no seu nobre sentido de prestação de uma função pública primacialmente orientada para a tarefa de contribuir para a defesa de uma ideia de justiça, enquanto actividade ao serviço dos Direitos do Homem, mas sim de uma mecânica e acrítica inserção num sistema hierarquizado e responsabilizante univocamente orientado, numa pura lógica de eficácia, para a formal produção de resultados estatísticos.

Desde a Lei Orgânica de 1978, a coerência introduzida na organização do Ministério Público - configurado constitucionalmente como órgão do poder judicial, dotado de autonomia institucional e dotado de governo próprio - com as sucessivas reformas, nomeadamente a de 1998, com a criação dos DIAP´s e DCIAP, a desconcentração dos poderes (PGR, PGD´s, e Procuradorias da República), a criação de departamentos de apoio especializados (NAT e GDDC), parecia seguir um caminho lógico de amadurecimento democrático. O apuramento organizativo do Ministério Público passou, historicamente, por uma desconcentração da hierarquia e uma crescente especialização dos magistrados.

Ao longo destes quase 40 anos decorridos após a aprovação da Lei Orgânica de 1978 que retirou natureza vestibular à magistratura do Ministério Público, autonomizando-a e conferindo-lhe uma forte identidade, trilhámos um caminho de consolidação normativa quanto à natureza, atribuições e estatuto do Ministério Público. Atingindo a magistratura do Ministério Público um ideal projectado de maturidade funcional, apresentando-se, em plena idade adulta, como uma magistratura "aberta a partilhar a responsabilidade mas insubmissa à prepotência e à burocracia", magistratura com estatuto de paralelismo com a Magistratura Judicial, dotada das suas prerrogativas próprias de autonomia (externa e interna), isenção e objectividade, estabilidade e responsabilidade.

A moldura institucional traçada pelo novo Mapa Judiciário, a LOSJ e respectivo regulamento que lhe deram corpo, a latência da aprovação de um novo Estatuto do Ministério Público, uma vez aliada ao corifeu das vozes que, nalguns bastidores sociais e mediáticos, caracterizam os magistrados e, em especial os do Ministério Público, como contrapoder, força de bloqueio, portadores de agendas ocultas e anseios de protagonismo, fazem-nos vivenciar tempos singulares de teste à solidez e firmeza do Ministério Público.

A conjugação de factores como o alargamento dos limites territoriais da Comarca com a crónica insuficiência de magistrados do Ministério Público face à multiplicidade de funções que lhe estão estatutariamente atribuídas (característica nacional que desvirtua análises estatísticas comparativas de ratios de magistrados/população referentes a outros ordenamentos jurídicos europeus que limitam o domínio funcional do Ministério Púbico à acção penal) franqueou uma porta para ataques práticos, sistemáticos e efectivos à garantia constitucional da estabilidade e ao caminho progressivo de uma especialização. Perigo este que se, na prática, pode ser combatido com alguma inventividade e criatividade inexigível a quem coordena, pode igualmente ser devastador para os desempenhos funcionais e vidas pessoais dos magistrados onde vinguem puras perspectivas burocráticas de eficácia numérica da actuação do Ministério Público.

O estatuto de 1998, relembre-se, havia reforçado as garantias de estabilidade, prevendo relativamente a comarcas sede de distrito judicial o concurso para tribunais e departamentos específicos, nos termos do regulamento aprovado pelo CSMP.

Com o novo quadro legal e estatutário a organização interna e gestão dos quadros do Ministério Público passará a ser uma matéria de particular melindre, onde se haverão de sopesar critérios de eficácia com critérios mais substanciais de natureza estatutária. O mesmo ocorre com as matérias da colocação, transferência e promoção dos magistrados.

A indefinição e sobreposição de funções ao nível da hierarquia intermédia do Ministério Público acarreta em si o perigo de conflitos cuja resolução passará por um movimento contra-histórico de centralização e concentração de poderes hierárquicos.

Não resulta do acaso a atribuição aos órgãos colegiais, como o CSMP e o Conselho Consultivo, de funções que, respeitando, respectivamente, à gestão e disciplina da magistratura ou ao domínio da consulta jurídica, não se encontram directamente ligadas à actividade processual ou ao exercício de competências de iniciativa e acção. Ao admitir-se uma fragilização da garantia constitucional da estabilidade franqueia-se a porta à introdução de riscos de intervenção enviesada na própria actividade processual dos magistrados do Ministério Público e na isenção que lhe deve presidir.

Se não é possível esculpir as leis em mármore, importa, todavia, não as fazer de barro, ao sabor das contingências históricas e ímpetos reformistas de cada momento, sendo hoje de particular relevo a prerrogativa do CSMP de propor alterações legislativas quando tal se justifique.

O prestígio da justiça e seus agentes depende de mecanismos informais de legitimação que funcionam através das representações sociais da mesma, o que impõe uma particular atenção à comunicação social, seja a realizada através dos meios tradicionais, seja a efémera comunicação aparentemente atomística e informe veiculada pelas redes sociais. Importa, pois, que no seio do CSMP, haja tal realidade em vista quando se trata de avaliar condutas dos magistrados que, de algum modo, se conexionam com tais meios comunicacionais, mormente quando se trata de estabelecer uma fronteira razoável entre o dever de reserva que impende sobre os mesmos e o exercício funcionalmente inalienável da sua cidadania.

Hoje, mais do que nunca, no especial contexto histórico nacional, e sob pena de uma amnésia funcional colectiva - maxime nos sectores mais jovens da nossa magistratura que, mercê da crescente especialização e precoce inserção em departamentos fortemente hierarquizados, correm especiais riscos - importa manter viva a memória desse trilho identitário da magistratura que integramos.

Importa, igualmente, como sinal de amadurecimento institucional, conviver dialecticamente com a multiplicidade de vozes que se foram tornando audíveis no seio da Magistratura do Ministério Público, sem receio do enfraquecimento da defesa e promoção do nosso estatuto funcional.

O compromisso que convosco assumo é o da firme e transparente defesa desta matriz de independência externa e de autonomia interna da nossa magistratura e da adequação dos quadros e direitos estatutários dos magistrados às respectivas incumbências constitucionais.

Lista dos Procuradores da República e dos Procuradores-Adjuntos que se candidatam ao CSMP, para o triénio 2017-2020

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